Até 10.000 empregos no setor informal de Dakar podem estar em risco se não forem tomadas providências para incluir os trabalhadores informais no futuro projeto do sistema do Bus Rapid Transit (BRT) da cidade, alerta um relatório encomendado pela Federação Internacional dos Trabalhadores em Transportes.
O Relatório de 2020 da pesquisa de avaliação do impacto sobre o trabalho no Bus Rapid Transit de Dakar destaca a realidade dos trabalhadores em transportes públicos informais em Dakar e os principais problemas que enfrentam, incluindo insegurança no trabalho, salários baixos, longas horas, assédio e falta de treinamento ou via de acesso para o trabalho formal. O relatório está sendo publicado esta semana para coincidir com a conferência Transformando o Transporte 2021, que está sendo organizada em conjunto com o Banco Mundial. Juntamente com o Banco Europeu de Investimento e o Fundo Verde para o Clima, o Banco Mundial é o parceiro financiador majoritário do projeto do BRT de Dakar.
Com base em pesquisa realizada antes da pandemia de Covid-19, os achados do relatório são ainda mais pertinentes quando os governos implementam planos de recuperação econômica. “A Covid-19 expôs as vulnerabilidades dos trabalhadores do setor de transporte, principalmente dos trabalhadores informais”, disse Papa Sakho da Universidade Cheikh Anta Diop de Dakar, que é um dos autores do relatório.
“Com poucas proteções financeiras, os trabalhadores em transportes informais têm sido devastados pela pandemia. Mais inclusão, consulta e vias de acesso para o emprego poderiam beneficiar milhares de mulheres e homens em tempos de dificuldades econômicas sem precedentes. O BRT poderia ser uma oportunidade para a formalização de áreas da economia do transporte informal e para impedir que alguns dos trabalhadores mais vulneráveis de Dakar fossem deixados para trás.”
O relatório encontrou níveis extremos de insegurança entre os trabalhadores informais do transporte em Dakar, e somente 6% declararam ter contrato de trabalho com o empregador. As mulheres são as que menos têm contrato, com somente 2,5% comparado a 7,5% dos homens. Dois terços de todos os trabalhadores entrevistados (68,7%) não tinham empregos regulares e 57% disseram que sua renda vinha diretamente das tarifas dos clientes.
O relatório descreve medidas práticas para uma transição justa do transporte informal para o formal. Isso envolve aprofundar o conhecimento da natureza da força de trabalho informal e avaliar as possíveis implicações do BRT nas subsistências e condições de trabalho dos trabalhadores informais.
O processo de consulta e planejamento do BRT deve, igualmente, analisar os impactos de gênero do projeto. Há mais mulheres do que homens nas ocupações mais precárias em transporte do Senegal e, logo, serão afetadas de forma desproporcional pela formalização e introdução do BRT. Por exemplo, poucas mulheres trabalham a bordo de ônibus como condutoras, o que as coloca em mais risco de perder o emprego devido à automação. Há também mais mulheres do que homens em funções de comércio nas estações ou paradas.
Apesar das recomendações do relatório do ITDP de 2004, Estudo de Pré-viabilidade para o Bus Rapid Transit em Dakar, assim como as obrigações do Banco Mundial de analisar os impactos sociais e ambientais do BRT, no tempo do estudo havia pouca ou nenhuma consideração do impacto sobre as subsistências nos serviços de transporte informal que estão ameaçados pela introdução do BRT. Os sindicatos e associações que representam os trabalhadores informais em transportes também não foram consultados.
Os trabalhadores informais entrevistados para o relatório sabiam muito pouco sobre o BRT: 76,5% dos trabalhadores disseram que não conheciam o plano. Agora, com a construção do BRT em andamento, isso provavelmente deve ter mudado, mas o relatório destaca como pouco tem sido feito para engajar os trabalhadores na fase inicial do projeto. “Foi quando eu voltei da cidade … que soube que tínhamos sido desalojados. Eu não estava registrado, eu soube pela imprensa que as obras do BRT estão começando”, disse um comerciante de carros. Mais de 56% dos trabalhadores entrevistados disseram que estão em risco de perder o emprego com o estabelecimento do BRT.
O relatório faz várias recomendações para garantir uma transição inclusiva e justa para o BRT, a começar por incluir os trabalhadores informais e os sindicatos no processo de consulta. Embora os representantes dos proprietários de veículos tenham sido incluídos nas consultas do BRT, eles não falam por todos os trabalhadores e, na verdade, em algumas áreas, têm interesses bem diferentes.
Recomenda-se também que sejam ouvidas as propostas dos próprios trabalhadores para a formalização da indústria. Essas propostas incluem o oferecimento de mais oportunidades para treinamento vocacional, especialmente para mulheres, priorizando os trabalhadores informais no recrutamento para o BRT e melhorando os locais de trabalho, incluindo através do fornecimento de instalações como banheiros, abrigo e água potável.
Sob a liderança de Gora Khouma, secretário-geral do sindicato Union des Routiers do Senegal (URS), a ITF e seus afiliados e associações de motoristas locais já fizeram contato com o Conselho Executivo de Transporte Urbano em Dakar (CETUD) sobre o BRT e a promoção de empregos decentes no setor de transporte urbano.
“Estamos clamando ao CETUD, às autoridades senegalesas, ao Banco Mundial e a outros doadores e investidores internacionais que priorizem o bem-estar de milhares de trabalhadores informais no BRT”, disse o representante da ITF para a África Francófona, Bayla Sow. “As melhorias de suas condições de trabalho e subsistências serão em benefício dos passageiros e da economia de Dakar como um todo.”
FIM
Observações para os editores:
- O relatório completo está disponível para download em: https://www.itfglobal.org/en/reports-publications/dakar-bus-rapid-transit-labour-impact-assessment-research-report-2020.
- O relatório foi encomendado pela ITF e realizado por Mamadou Bouna Timéra, Momar Diongue e Papa Sakho no Laboratório de Geografia Humana (LABOGEHU) da Universidade Cheikh Anta Diop, Dakar, Senegal, e Dave Spooner, do Instituto Global do Trabalho (GLI), Manchester, Reino Unido.
- A ITF encomendou uma semelhante avaliação do impacto sobre o trabalho em Nairóbi e o GLI também realizou um estudo profundo sobre a força de trabalho informal de Kampala.
- O relatório da ITF pode ser lido em conjunto com o relatório Transporte informal de passageiros além da Covid-19: Um guia sindical para formalização liderada pelos trabalhadores.